Na 1ª parte, falámos da tendência de crescimento da
atividade do Turismo, da indústria hoteleira em geral, como algo civilizacional.
Já dizia Fritz Joussen, CEO do grupo TUI em fevereiro último: “nós não somos
apenas um grande operador, isso era dantes, o nosso negócio é agora hotéis e
cruzeiros. Cada vez mais assim será porque o Turismo é uma indústria em
crescimento e nós seremos um grupo cada vez mais global e acutilante”. Estas
palavras, vindas de um “insider” do ramo, dizem muito sobre o “zeitgeist”, o
espírito dos tempos que correm.
A propósito, existem duas áreas em forte expansão: os
cruzeiros oceânicos de curta e média duração são cada vez mais apelativos, não
sendo alheio este “boom” à imagem de segurança antiterrorismo que uma
embarcação proporciona devido ao controlo de acessos, em contraste com uma
praia cheia de pessoas sem qualquer restrição de acesso. Só na Europa, 75 novas
embarcações deverão entrar ao serviço na próxima década. Em 2017, espera-se um
aumento de um milhão de passageiros em relação a 2016, a nível mundial, seja de
24 para 25 milhões. A outra, é o “bleisure”. Uma mistura de viagem teoricamente
de “business” mas que tem uma forte componente de “leisure”. Esta é mais uma
tendência a explodir em alta nos próximos tempos, uma realidade, cremos,
imparável.
Em relação ao dito “boom”, vamos começar pela Europa. De
Portugal já está tudo dito. A tendência é de expansão. Não acreditamos na
repetição de crescimento anual da ordem dos 10% como um todo, mas seguramente
teremos boas surpresas em novos mercados dentro do mercado nacional. O exemplo
dos Açores vai merecer tópico próprio, mas teremos expansão um pouco por todo o
lado, não só em Lisboa, Porto e Algarve. Se for assim, ainda bem. É uma
importante fonte de emprego e rendimentos de que todos devem poder participar.
Para quem beneficiou de um ano em cheio, manter o mesmo nível ou aumentar um
pouco que seja, já será motivo para abrir a garrafa de espumante.
A Espanha continua imparável. Tem uma oferta espantosa, tem
o continente e ilhas, tem uma diversidade invejável a todos os níveis o que
confere possibilidades de experiências únicas. Foi, este ano, dos grandes
beneficiários das perdas da Turquia, Egito e Tunísia. Tudo indica que assim
continuará, com brutais ocupações tanto nas Baleares como nas Canárias (a
abarrotar na Páscoa de 2017, segundo as primeiras projeções com base em
reservas reais). É um mercado maduro e constante. Por muito que tentem travar a
realidade, não há volta a dar: Madrid e Barcelona (sobretudo esta) continuarão
a ser destinos de topo nesta Europa de cidades históricas. Há quem queira
travar o “boom” de turistas em Barcelona. Há vinte anos atrás já se falava do
assunto. Não travaram nem travarão. Se tomarem medidas radicais, acabarão por
chorar para que os turistas regressem. A vida é assim. Se nas ilhas ainda se
pode admitir esse debate devido às especificidades próprias de uma ilha, nos
territórios continentais é mais complicado entrar nesse tipo de conversa.
O turismo francês sofreu muito com o terrorismo.
Interessante como a sociedade da informação dos nossos dias tem um efeito muito
rápido sobre os consumidores de viagens. Que o digam as plataformas de reservas
online, as quais sofreram uma queda
(global) impressionante de marcações nas horas que se seguiram à notícia do
ataque a Paris. Em breve as reservas retornaram ao ritmo normal, mas não em
França e muito menos em Paris (a hotelaria de 5 estrelas foi obrigada a reduzir
preços entre 25 a 45%) e posteriormente em Nice. Aliás, neste último caso toda
a Côte d`Azur sofreu quebras. O país está a tentar recuperar, mas é cedo para
tal. Ainda nem sequer se podem calcular os prejuízos causados pelos eventos em
causa, sobretudo na cidade luz. O mesmo se pode dizer sobre Bruxelas, na
Bélgica. Eis outra cidade debaixo de fogo e em forte ameaça. Ainda hoje tenta
recuperar o espaço perdido na cena turística europeia. Por seu turno, a Holanda
continua a ser muito popular com mais de 14 milhões de turistas, maioritariamente
europeus. Na última década cresceu mais de 40% e a tendência é de estabilização
em alta, sendo que Amesterdão continua no seu eterno “boom” ao ponto do
Presidente da Câmara sugerir outros locais para os turistas (?) devido a
queixas dos residentes. Imagine alguém dizer aqui entre nós – seria algo para
pegar fogo na opinião pública.
Em relação à Alemanha, uma nota especial: para os mais
distraídos, este é um grande mercado emissor (outbound) por excelência.
Ponto final. É uma verdade, mas não nos podemos esquecer que até este gigante
europeu vive o seu “boom” tranquilo, com subidas constantes. Terá passado a
fasquia dos 35 milhões de visitantes fora o fabuloso mercado interno, o qual se
fortaleceu por conta dos cancelamentos no médio oriente. Já em 2015 tinha
atingido o número impressionante de 433 milhões de dormidas. Sim, não há erro.
Talvez feche 2016 com um aumento de 3%. Muitos germânicos preferiram as
próprias praias dos mares do norte e do báltico do que optar por outros
destinos. Ou fazer cruzeiros, muitos dos quais nos frios mares dos países nórdicos,
algo que ajudou ao “boom” desse tipo de turismo. No total, são muitos milhões
de turistas num país em que essa atividade passou a ser considerada de vital
importância. Há quem esteja a adiar viagens para o estrangeiro também por causa
da crise dos refugiados. Daí que muitos lugares turísticos estejam a conhecer
uma inesperada expansão. Isto para não falar de “clusters” ou situações
curiosas como os norte-americanos que retornam como turistas quando só lá
tinham ido como tropas de ocupação, só para nomear um caso. Até ao recente
atentado do mercado de Natal de Berlim, a capital conhecia também um fortíssimo
crescimento de visitantes nacionais e estrangeiros. Ainda não há dados sobre as
consequências imediatas do sucedido. Em relação aos vizinhos, como a Suíça e
Áustria, acabam por beneficiar por isso mesmo, são vizinhos da Alemanha, são
ótimos destinos para viagens de curto curso. O caso austríaco merece uma
referência especial: o turismo de neve continua estável, mas há um “boom” do
turismo cultural, relacionado especialmente com a musica clássica. Salzburg é
um exemplo fabuloso: é das cidades europeias mais visitadas por turistas
chineses, se é que não atingiu já o topo. Mais uma prova que há “muitos turismos”, ou seja, todas as
experiências, todas as ofertas e possibilidades devem ser levadas em conta.
A Itália é outro caso emblemático. Um misto enorme dessa
variedade de experiências com grandes diferenças do norte para o sul. Mais um
país em pleno “boom” sendo que as causas impressionam: além do aumento de
visitantes estrangeiros, mais de 33 milhões de nacionais terão feito viagens
pela sua terra neste ano de 2016. O turista italiano decidiu “ajudar” a
economia do próprio país, inundando todos os lugares com destaque para as belas
praias ao longo do verão. Não podemos deixar de falar de Veneza, o exemplo
clássico de “gentrification”, que perdeu dois terços dos residentes em cinco
décadas por conta da completa reconfiguração da cidade à medida que a procura
crescia desmesuradamente. Crescia e cresce – os recordes de visitantes são
constantemente batidos. Vale a pena ficar de olho naquela realidade se queremos
respostas à questão fundamental que rege todo e qualquer destino e que passa
por se saber se há limites à expansão do mesmo, se há limite para o número de
visitantes, alojamento, restauração, etc… a discussão sobre o assunto,
interessante, pode-se acompanhar em #venexodus.
Mais a leste, segue a forte expansão na República Checa,
pode-se já considerar Praga como um mercado “maduro”, mas outros pontos do país
despertaram para os turistas. A Polónia tem uma forte presença alemã. A
Eslováquia, sobretudo Bratislava, é outro destino a ter em conta. Na Croácia,
temos um pequeno “boom” em pleno Adriático. A propósito, Zagreb vive uma grande
expansão, tal como Belgrado na Sérvia, sendo este último uma surpresa para
muitos. Até a Bulgária com o seu mar Negro vive momentos de glória (melhor
Verão de sempre), situação que parece se expandir em à Roménia. Em relação à
Grécia, temia-se uma queda, também devido à crise dos refugiados, mas quedas
pontuais nalgumas ilhas foram compensadas por subidas noutras ilhas gregas.
Creta, por exemplo, dá mostras de não se ir abaixo. Rhodes, porém, foi muito
afetada. Inclusivamente, importantes setores do mercado alemão substituíram,
até ver, o destino Turquia pelo destino Grécia, o que foi importante para os
locais. A Turquia foi, como sabemos, o grande perdedor. Depois de ataques
terroristas e da “intentona” chegou a ter quedas de reservas da ordem de 60%,
mas acabou por perder “apenas” um terço do turismo. Este “apenas” é muito
irónico: imagine-se o que seria se tal ocorresse no Algarve? Desde logo a
Turquia perdeu muito nos principais mercados emissores como é o caso da
Alemanha. Praticamente ficou sem o turista Russo, deveras importante. Ainda
assim cresceu num mercado…. o da Arábia Saudita!! A Turquia deve agora tentar
recuperar, mas as feridas podem levar muito tempo a curar para desespero dos
grandes operadores que estavam acostumados com receitas em euros e despesas em
liras turcas, situação que explicava o forte “boom” anterior a esta crise. Cabe
aqui uma chamada de atenção: os mercados do médio oriente devem continuar
expostos a fortes tensões políticas pelo que qualquer arremedo de recuperação
poderá revelar-se incipiente.
Em relação a outros mercados do velho continente, deve-se
falar do bom desempenho das chamadas repúblicas Bálticas ou mesmo da cidade
Russa de S. Petersburgo. Grande surpresa está a ser Lviv, na Ucrânia. As
capitais nórdicas continuam a ser bem procuradas, são mercados estáveis.
Destaque aqui para a Islândia, país agora mais “barato” em tempos de pós-crise financeira.
Há um grande “boom”, aqui sim, com crescimento em 2016 entre 25 a 30% - um
espanto. Terminando com as ilhas
britânicas, deve-se dizer que os mercados das Irlandas, Escócia e Gales
continuam em bom desempenho, tal como Londres, capital do Reino Unido. Aqui a
grande expetativa para o futuro próximo tem a ver com os efeitos do “Brexit”,
uma verdadeira incógnita. Para já, uma boa notícia para o espaço da Libra
Esterlina: Londres viu um aumento de turistas vindos do extremo-oriente e dos
EAU na ordem de 25% na comparação do 4º trimestre de 2016 com igual período de
2015 – isto quer dizer movimento em alta nas lojas e “shoppings” bem como na
excelente hotelaria londrina. Lembremo-nos ainda da oferta em expansão na
cidade. São mais 38 hotéis de topo em projeto e/ou construção, totalizando
8.500 novas camas. Até agora, o “Brexit” não foi mau para o turismo inglês.
Veremos como será mais para a frente…
Em geral, podemos falar de uma expansão quase generalizada
do turismo europeu com alguns locais a “explodirem” em alta. Os capitais
“inteligentes” estão atentos a estas realidades, não brincam em serviço. Só em
termos de dinheiros asiáticos, tivemos recentemente 1,6 mil milhões de euros em
investimentos na hotelaria europeia. Será viável? Será uma “bolha”? O futuro o
dirá. Uma coisa é certa, o mundo das viagens está em alta, tanto o “baratinho”
como o médio ou as viagens de luxo.
No norte de África, nem tudo são más notícias: Marrocos está
a começar a viver o seu próprio “boom” graças a uma relativa paz social em
contraste com outros mercados da região. A confiança é grande e a construção de
novas unidades é uma certeza para os próximos quatro anos – são 52 novos
projetos em carteira. Abaixo do Sahara, Cabo Verde vai “explodir” em alta muito
por conta de grupos internacionais como o caso do grupo RIU (ligado à TUI). São
Tomé e Príncipe, Nigéria, Ruanda (sim), África do Sul, Tanzânia, Quénia – tome
nota destes nomes, vão dar que falar. Só nos próximos dois anos devem abrir na
África subsaariana mais de dez mil novas camas turísticas.
O Dubai continua a ser o grande fenómeno contemporâneo, não
param de abrir unidades, nomeadamente de luxo. Já passou este ano o número de
cem mil quartos de Hotel, quase todos de luxo. Será sustentável? Essa é a
grande questão para o futuro próximo.
O grande “boom” continua a ser na Ásia e Ásia/Pacífico: a
Índia começa a ser um caso sério não só no “inbound” como no “outbond”,
enquanto mercados maduros como as fabulosas Maldivas (mais de 8% de subida) ou
mesmo o Sri Lanka ou a Tailândia continuam com perspetivas muitíssimo boas. Mas
o destaque vai para o Laos, Camboja, Vietname – nomes emergentes no setor do
Turismo. Aqui está mais um “boom” a ter em conta, enquanto a Indonésia comemora
um aumento de 16% de receitas em 2016 (números provisórios). Recorde-se que a
ilha de Bali sofreu há uns anos um revés igual ao da Turquia, devido ao
terrível atentado numa discoteca cheia de jovens Australianos. Hoje, está tudo
ultrapassado, sendo um mercado em alta. Isto prova que os mercados afetados
pelo Terror recuperam bem, embora possa levar algum tempo. Mas essa recuperação
é mais viável se os atentados forem um ato isolado e não se repetirem com uma
certa frequência. Destaque também para o bom desempenho lá longe na Oceânia,
tanto nas pequenas ilhas como na enorme Austrália. Neste último caso, quem
lidera o “boom” é o mercado Chinês. Aliás, a China é a grande responsável pelo
sucesso destes mercados. Foram mais 18% de turistas chineses no exterior do país
este ano, crescimento muito superior ao do PIB chinês. Ainda assim, somando
outros mercados da região, dá cerca de 10% de aumento de turistas a passear no
estrangeiro. Havendo recursos, as pessoas viajam: aquilo que era um ícone do
mundo ocidental transforma-se num ícone global. Ninguém deve, assim, sentir-se
apanhado de surpresa pelo sucesso do Turismo.
Uma palavra final para as Américas: o Canadá é muito
visitado, sobretudo por turistas internos e do mesmo continente, com destaque
para os vizinhos a sul. Por falar em Estados Unidos, apesar do enorme aumento
da oferta hoteleira (que não vai parar nos próximos anos), não se pode falar em
“boom”. É um mercado maduro, tem um turismo interno como nenhum outro, o que é
normal em qualquer país de dimensão “continental”, o qual cresce em “tandem”
com o crescimento do PIB. Seja como for, sem ser um crescimento explosivo, é
positivo, tanto o PIB geral como o do setor de viagens. Os EUA são responsáveis
pela forte procura no setor de cruzeiros, mas isto não é novidade alguma. O
México, República Dominicana, as Caraíbas em geral estão em bom plano, sendo
que o novo “boom” da região virá de Cuba. Crescerá 10% e tem muita margem para
crescer ainda mais, sobretudo se “as portas” se abrirem em força para lá da
capital, Havana. Na América central e do sul, queremos destacar a Colômbia
pós-guerra civil que vai agora ter outra “explosão”, a do Turismo. Também o
Perú parece preparado para fortes altas, sendo o Chile outro destaque. O Brasil
é apontado como uma grande possibilidade de sucesso no longo prazo, mas, de
momento, sofre uma terrível crise económica e social que inibe qualquer
hipótese de crescimento no setor, ao ponto de existirem ofertas de última hora
para o “reveillon” no nordeste em que um casal paga a viagem de uma pessoa e
ganha duas viagens. A crise é um desespero, mas melhores tempos virão ainda que
isso demore. A OCDE fala de “boom” em lugares como África do Sul, Índia, Brasil
nos próximos 15 anos, mas é preciso ter em conta certas especificidades. Muitas
vezes neste mercado, tal como noutros, é fácil adivinhar o futuro, difícil é
saber quando é que esse futuro chega. O “timing” não é desprezível quando se
trata de perspetivar os próximos tempos.
Certo é que a confiança está em alta: só os nove maiores
grupos hoteleiros internacionais são responsáveis por mais de 2.500 novos
projetos hoteleiros, totalizando mais de 550 mil novos quartos. Globalmente são
muitos mais. Se estamos em presença de investimentos com sentido perante as
boas perspetivas ou, pelo contrário, se será apenas mais uma de muitas bolhas
de investimento… o futuro o dirá. Acreditamos mais num misto de ambos conforme
as circunstâncias e os locais onde tudo isto acontece.
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