sexta-feira, 12 de maio de 2017

Urgente: novas unidades hoteleiras algarvias podem não abrir como previsto

Como a escassez de habitação está a ser um problema para o próprio Turismo

Não, hoje não vamos falar da bronca recente no Aeroporto de Lisboa, apenas uma de muitas que ocorrerão, infelizmente, à medida que a capacidade se for esgotando até rebentar pelas costuras.

Hoje vamos falar de uma consequência óbvia, já esperada, do atual “boom” do turismo. Mais uma vez há que levantar o assunto porque, ao que parece, ninguém se está a preocupar com as consequências do dito… para o próprio setor do turismo. Todos sabem como temos avisado para o crescimento do setor de viagens e turismo. Ainda é cedo, mas estamos quase a rever em alta as previsões do crescimento em Portugal para 2017. Deixamos apenas um exemplo, segundo a Blick alemã. Há mais germânicos a reservar em Portugal (25% a mais do que no ano passado), número impressionante, só ultrapassado pela Islândia e Chipre. Sabe-se também que a Grécia deve subir (total estrangeiros) uns 10%, pelo que Portugal poderá também atingir números semelhantes.
Em Portugal, o primeiro quadrimestre foi um sucesso e alguns lugares parecem viver um verão “todo o ano”, tal o aumento de turistas, sobretudo estrangeiros. Considerando que temos agora a França a ultrapassar o Reino Unido em termos de gastos totais, considerando que os chamados “mercados maduros” estão em alta, bem como os mercados menos relevantes, há razões para acreditar que voltaremos a bater recordes atrás de recordes.

Tudo isto tem várias implicações: maior volume de negócios, desde logo dos supermercados que têm de atender às necessidades diárias dos turistas de alojamento “self-catering”, aos estabelecimentos da área de F&B, alguns dos quais estão com aumentos de faturação muito significativos, empresas de transporte e rent-a-car e, claro, entre muitos outros, de toda a sorte de alojamentos turísticos, classificados ou não. Este acréscimo de movimento é positivo, diminuindo a sazonalidade e aumentando o rendimento de empresários e funcionários. Para não falar que, por óbvia necessidade, existem mais funcionários. Atendendo a esta realidade, atendendo também à saída, nos últimos anos, de muitos profissionais de hotelaria do país, graças a ofertas monetariamente mais vantajosas e mais seguras do ponto de vista laboral (sem falar do espírito de aventura e da experiência nova para quem quer melhorar o CV), temos uma enorme escassez de mão-de-obra em praticamente todas as áreas da hotelaria e similares. Ainda que essa escassez produza melhorias salariais, o problema não se resolve de uma forma simples. Melhores salários não são sinónimo de aumento de mão-de-obra disponível numa determinada região, pelo que é necessário recorrer a recursos humanos do exterior, nomeadamente de outros pontos do país. Este problema é grave em Lisboa e gravíssimo no Algarve. Aqui, há uma imensa falta de profissionais de F&B (muito grave) e de “housekeeping”. Este problema não é inteiramente novo, mas conhece agora novos contornos. Era muito comum ofertas de emprego com possibilidade de alojamento, sobretudo para atender à procura da temporada alta (nalguns casos até 6 meses de contrato). O problema novo prende-se com a falta de alojamento “em conta” para o trabalhador comum.

Na realidade, devido à soma de fatores bem conhecidos, o mercado imobiliário está novamente ao rubro. É praticamente impossível comprar um imóvel por um preço acessível, o mercado das vendas está inundado, isso sim, por imóveis bem caros para “outros públicos”, onde se incluem aposentados da EU ou candidatos ao chamado “gold visa”. Como se isso não bastasse, o arrendamento a preços razoáveis é quase impossível devido à adesão em massa ao negócio do Alojamento local, agora mais facilitado por plataformas como booking.com, airbnb, entre muitas outras. Cabe esclarecer que somos favoráveis ao AL, até porque isto representa diversas formas de alojamento com muita procura, nem todas “low cost”, mas consideradas importantes para responder ao aumento da procura, ao mesmo tempo que “liberta” os Hotéis com melhores infraestruturas para tipos de público mais “sofisticados”, sobretudo tratando-se de unidades com uma preocupação séria em recuperar o espírito social do espaço e a oferta de serviços e “amenities”.
A grande questão é a seguinte: considerando que muitos imóveis “desapareceram” do mercado, quer de venda, quer de arrendamento de longa duração a favor do aluguer turístico de curto prazo (eis a função do AL), o mercado imobiliário ficou “distorcido”. A realidade é cruel. Em Lisboa o problema ainda pode ser “disfarçado” pela imensidão em que se tornaram os municípios vizinhos – ainda que tal seja considerado “gentrification”, não deixa de ser uma solução para moradia acessível para a maioria da população. Mas no Algarve não se trata disso. Simplesmente não existem praticamente habitações para quem queira vir de fora para trabalhar. Para se ter uma ideia clara do que afirmamos, o município de Albufeira tem hoje mais de 3.000 fogos licenciados para AL. Em Lagos serão mais de 2.300 fogos. Por todo o Algarve, a situação repete-se com maior ou menor dimensão. Se é verdade que, outrora, tal já ocorria, especialmente na época alta, hoje verificamos que estas habitações, moradias ou apartamentos estão consignadas em exclusivo a esta atividade. Recorde-se que a facilidade (simplex) de início de atividade, prevista na legislação em vigor, conjuntamente com a expetativa de participar nos rendimentos do atual “boom” turístico levam à ampliação desta atividade até níveis extremos. Acaba por se tornar uma moda, pode vir a ser mais uma gigantesca bolha, daquelas que acaba em desilusão.

Mas o que importa é a consequência imediata (e para o futuro próximo) desta realidade. Não há habitação para possíveis migrantes ou imigrantes que procurem trabalho. Ficarão postos de trabalho por preencher. Não só no turismo, mas sobretudo no turismo. Isso causa imenso “stress” para quem quer desenvolver e mesmo expandir a sua atividade, os seus negócios. As consequências ficarão bem visíveis não só na presente temporada (já parece Verão) mas nas próximas, caso o crescimento continue, ainda que não tão evidente. Seja como for, crescimento é crescimento. Ponto final. Os pressupostos que levam a este texto mantêm-se inalterados.

É um assunto que não está na imprensa “mainstream”, mas não demorará muito. Sobretudo, se se confirmarem rumores a que este blogue teve acesso e que são já de si extremamente negativos: é bem possível que duas novas unidades hoteleiras no Algarve, as quais deveriam abrir no Verão, não consigam abrir as suas portas ao público, como previsto. Uma abertura em pleno Verão já seria complexa, devido à falta de pessoal qualificado que se tornou estrutural. Dado que estamos a atravessar esta novíssima crise, a falta de pessoal torna-se gritante, incomportável. Não se podem abrir unidades de 4 ou 5 estrelas com “meia-receção”, “meio-restaurante” ou “meia-limpeza”. Em breve saberemos se estes rumores são mesmo verdade. Esperemos que não, mas, ao se confirmarem, vão acabar por colocar o dedo na ferida de um problema que não passa de um acidente à espera de acontecer. Este assunto ainda vai dar pano para mangas.

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